por Ana Fiori*
Em outubro de 2007, romeiros que deslocavam pelo Rio Mogi Guaçu em barcos ou botes para chegar até Aparecida do Norte, município do estado de São Paulo que tradicionalmente recebe devotos de Nossa Senhora Aparecida, estouraram rojões. Um deles caiu no Rancho Pirajussara, localizado na cidade de Descalvado, também em São Paulo, e provocou um incêndio que destruiu a mata ciliar, a vegetação à beira do rio.
Por conhecer a importância da mata ciliar, uma Área de Proteção Permanente (APP) que evita a erosão do solo e deixa a água mais limpa, os engenheiros florestais Laerte Scanavacca Júnior, doutor em Ciências Florestais e pesquisador da Embrapa Meio Ambiente, e Maria de Fatima Adorno, consultora ambiental, procuraram os proprietários da Fazenda Santa Luzia, que produz cana-de-açúcar e onde o Rancho Pirajussara está instalado.
Já em 2008, os engenheiros analisaram o estrago produzido pelo fogo. Apenas 53 árvores de 21 espécies sobreviveram ao incêndio nessa área de transição entre a Mata Atlântica e Cerrado que era utilizada para o lazer dos proprietários. A área devastada foi invadida por capim colonião, com 3 metros de altura.
Laerte e Maria de Fatima fizeram cerca de três visitas ao Rancho Pirajussara e ao Horto de Vassununga, bem próximo dali, para ter uma base da fisionomia da floresta da região e poder desenvolver o projeto de restauração ecológica.
O projeto considerou a produção de frutos para a subsistência de pequenos produtores, que compram ou trocam mercadorias produzidas em suas propriedades, além de abrigo e alimentação para a fauna. Foi implantado com a maior diversificação de espécies vegetais possível e se estendeu até 2012, com mais de 80% da floresta recuperada. Descontando a área construída, tudo foi replantado, totalizando cerca de 1,5 hectare.
Todas as espécies utilizadas para replantar a mata ciliar atraem os animais como abrigo e algumas, principalmente as remanescentes do incêndio, são fonte de alimento para eles. Há alguns anos, um dos proprietários relatou o aparecimento de uma onça-pintada. Isso indica que no rancho, localizado no meio de um canavial, há alimento para a onça e suas presas.
No início da implantação do projeto, Laerte e Maria de Fatima começaram a produzir mudas para fazer a restauração ecológica do rancho. Metade foi feita na casa da consultora ambiental, enquanto a outra parte foi adquirida pelos proprietários em diversos viveiros idôneos na época do plantio, que foi acompanhado pelos engenheiros florestais. Eles ainda visitaram o rancho nos dois anos seguintes.
Três funcionários do próprio rancho e outros dois contratados especificamente para o projeto plantaram 429 mudas de 48 espécies botânicas perenes, divididas entre 28 famílias. Das 48 espécies, 18 são da Mata Atlântica, quatro do Cerrado e 26 exóticas. As exóticas em geral são frutíferas. Nas entrelinhas, feijão guando para proteger o solo e enriquecê-lo com nitrogênio.
Laerte comenta que o maior desafio foi achar mudas do Cerrado. “É quase impossível, muda de boa qualidade também é difícil, tem que conhecer o viveiro.” Felizmente, o pesquisador tem esse conhecimento, porque já trabalhou no setor de sementes de outra instituição.
Os custos de implantação de R$ 31.864 por hectare foram cobertos pelos proprietários, que garantiram que por eles a floresta viverá para sempre. De acordo com Laerte, esse valor é muito mais alto do que o de um reflorestamento com eucaliptos, atualmente em cerca de R$ 10 mil por hectare. “As mudas de espécies nativas ou que não sejam de eucalipto são bem mais caras, precisam estar com mais de 30 cm na época do plantio e a tecnologia de reflorestamento ainda está muito aquém da tecnologia desenvolvida pelas empresas florestais brasileiras.”
* Jornalista ambiental
Saiba mais
- “Rancho Pirajussara é restaurado depois de incêndio” – Embrapa, 3/1/2022
Imagens:
- Laerte Scanavacca Júnior e Maria de Fatima Adorno
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