É nesta perspectiva, ao meu ver, que devemos debater o projeto de reflorestamento da Tijuca na segunda metade do século XIX, que acabou se tornando, em escala global, um dos casos mais antigos e bem sucedidos de ecologia de recuperação. E a pesquisa histórica vem levantando novos elementos que ajudam a tornar o caso ainda mais fascinante. É importante superar, por exemplo, a imagem de que o projeto da Tijuca foi um esforço meramente empírico, pontual e burocrático, destinado apenas a garantir a continuidade do abastecimento de água nas partes baixas da cidade. É possível adotar uma perspectiva mais ampla, considerando-o como uma obra de inteligência coletiva, cujos objetivos políticos eram bem mais amplos, indo além da Tijuca e do Rio de Janeiro.
É claro que o tema específico da água era muito relevante. Com a destruição das matas, os rios e nascentes das montanhas começaram a perder sua capacidade de oferta. O governo central, aliás, estava atento para o problema desde as primeiras décadas do século XIX. Já em 1817 um decreto do príncipe português Dom João havia proibido o corte de árvores nas nascentes dos rios Carioca e Paineiras (incluindo as matas adjacentes) e ao longo do aqueduto até o Convento de Santa Tereza. Esta medida ajudou a coibir um pouco o desflorestamento local, apesar de ter sido em grande parte ignorada. Além disso, ela não tratou da devastação que ocorria em várias outras encostas da cidade, especialmente através do ciclo de plantação de café que durou até a década de 1840. De toda forma, apesar das sucessivas secas que prejudicaram a vida da cidade, especialmente a grande seca de 1843, as autoridades municipais não conseguiam reunir iniciativa e força política suficientes para enfrentar o problema.
Leia na íntegra: Artigo de José Augusto Pádua em O Eco, 17/10/2006